A CIANOSE DA ALMA

“Quem ama está sempre a rever e aprimorar seu horizonte, seu destino, pela escuta”

Iniciando mais um ano cronológico e litúrgico, temos maior estímulo a rever nossos passos e nossa direção, rumo à nossa felicidade maior: amar. 

Um bom viajante sempre recorre a seu mapa e à sua bússola, para conferir se está sabendo caminhar, seguindo o caminho desejado e desejando mesmo o melhor destino.

Rever-se constantemente na direção e na forma de caminhar é uma questão de inteligência e maturidade, inclusive no amor.

Para haver revisão, precisa haver abertura, reflexão e escuta. Ouvir o amor, para chegar a Ele é fator substancial àqueles que o elegeram como direção.

Na vida espiritual, os que se entendem como “filhos do Amor” encontram na oração, pela escuta, todas as respostas.

Claro que Deus, o Amor, fala através de várias vozes, não apenas a originalmente nascida em nossas consciências e afetividade (as quais devem ser bem discernidas). Ele fala, especialmente, por sua própria Palavra, assim como pelos fatos da vida, pelas pessoas que nos circundam (não apenas pelos que nos confirmam, mas também pelos que nos perseguem) etc... Ele fala, fala e fala ...  e até quando silencia está a se comunicar.

Para a alma humana (imagem e semelhança do Amor) buscar ouvir a Deus, atentar-se à Sua voz, que é constante, em nossa direção, é comparável à necessidade que o corpo físico tem de buscar o ar para manter a circulação e, consequentemente, a vida.

A cianose do corpo, pela escassez de oxigênio em nosso sangue, ocorre, geralmente, por duas vias: a) falta de oxigênio no ar inspirado e b) incapacidade de fixar o oxigênio. Quando  alimentamos nossa alma (coração e mente) de “ar” de má qualidade (carente de Amor e verdade) e/ou reservamos pouco tempo para respirar o ar do Amor, pela oração, não alimentamos nem fixamos a paz e cavamos a cianose de nossas almas. A oração profunda, de sincera escuta a Deus, sempre trará ânimo e direção a nosso coração, restabelecendo, primeiramente, a paz (o oxigênio espiritual) perdida.

Assim, a oração não é composta apenas de alguns momentos. Precisamos, sem dúvida, ter tempo para expandir nossa capacidade de escuta, reservando momentos para ampliar e corrigir nossa respiração interior. Mas, os momentos de oração devem nos levar a um “estado de oração”, sem dispensar momentos diários de aprofundamento, os quais chamamos de “montanha espiritual”, dois movimentos de respiração espiritual discorridos e detalhados na obra “Descobrindo o caminho da espiritualidade” (Ed. Paulus, 4ª edição), de nossa autoria.

Quando “respiramos” Amor, pela oração de escuta à Sua voz, estamos sempre a reler e atualizar nosso mapa, a ajustar nossa bússola e a limpar as lentes de nossa visão (olhos, óculos e binóculos), para não nos perdermos de nosso destino: a felicidade plena e verdadeira, que somente o Amor e sua vivência podem nos garantir, hoje e por toda a eternidade.

Por tudo isso, sempre é fundamental rever a jornada em todas as suas dimensões. Além disso, quem não alimenta os pulmões da alma com ar de boa qualidade irá, inevitavelmente, enchê-los de substâncias nocivas, contrárias às inspirações do verdadeiro Espírito do Amor (ar que precisamos constantemente e único capaz de nos trazer a verdadeira paz, em Cristo).

Destarte, se seguirmos a lógica do sistema respiratório humano, por analogia, podemos prever que o ar espiritual que devolvemos ao mundo será qualitativamente inferior ao inspirado. Mesmo quando inspiramos as maravilhas do Espírito Santo, devolveremos uma releitura de Amor indiscutivelmente inferior à inspirada. Ainda mais quando inspiramos um ar espiritual de má qualidade, somaremos a ele nossa próprias impurezas e devolvemos ao mundo releituras ainda mais contaminadas de desamor.

Outrossim, quem não encontra tempo para escutar a voz do Amor escutará vozes contrárias à vida, ventiladas ao nosso redor por tantas vozes e, inclusive, obtidas nos diversos meios de comunicação social, além das próprias vozes internas, que fraquejam e contaminam  nossa respiração existencial, especialmente quando ficamos ouvindo demais nossa ira, vaidade, ambição, inveja, desconfiança, avareza, ceticismo, medos, gula, libido e desânimo.

Que possamos respirar melhor em 2014.  

E um bom ano para todos nós!